Artigo de opinião de Armando Santos, presidente da Federação Nacional dos Prestadores de Cuidados de Saúde
A Rede Convencionada de Saúde é, atualmente, um dos poucos pilares do SNS onde os portugueses ainda conseguem encontrar resposta eficaz para as suas necessidades de saúde, e ficará em sério risco se não forem, devidamente, salvaguardadas as convenções em vigor, em consequência da extinção das ARS e da pulverização das suas atribuições e responsabilidades por 39 novas ULS – (leia-se 39 novos centros de decisão), medidas anunciadas como a “grande reforma da saúde para 2024”, “grande reforma” essa que não foi seriamente debatida com ninguém e da qual se desconhece os seus efetivos contornos e eventuais consequências.
Esta Rede Convencionada de Saúde nacional, com mais de 4.000 postos de atendimento espalhados por todo o país, constitui uma rede de proximidade que coloca a quase totalidade da população portuguesa a menos de meia hora de distância dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica – MCDT (análises clínicas, medicina física e reabilitação, radiologia, cardiologia, hemodiálise, gastrenterologia, medicina nuclear, etc.), fundamental para um dos pilares do Sistema de Saúde Português, que são os cuidados de saúde primários.
O setor convencionado está, como sempre esteve, ao dispor do País para complementar a atividade assistencial da rede pública e assim, concretizar o SNS e o desígnio constitucional de “cuidados de saúde para todos”, especialmente na situação particularmente difícil que atravessa o SNS.
No momento atual, entendemos que urge reforçar o SNS, através de medidas simples e de rápida implementação, aproveitando todos os recursos do Sistema de Saúde Português, garantindo que os cidadãos que não são beneficiários da ADSE, de qualquer outro subsistema de saúde público ou privado ou que não têm seguro de saúde, que é o caso da maior parte da população portuguesa mais desfavorecida, não ficam esquecidos.
Proposta de medidas imediatas para reforçar o SNS e melhorar o acesso das pessoas aos cuidados de saúde:
- Permitir que os estabelecimentos integrados no Serviço Nacional de Saúde utilizem as requisições de prescrição de Meios Complementares de Diagnóstico e Terapêutica (MCDT) para as entidades convencionadas com o SNS, (através da revogação do Despacho 10430/2011 de 18.08.2011).
- Lançar novas Convenções, através de um rápido procedimento de adesão para consultas e técnicas de especialidade, a que poderiam aderir todas as unidades de saúde licenciadas, para cada uma das valências, bem como todos os médicos com consultório privado e inscritos no respetivo Colégio da Ordem dos Médicos.
- Permitir que os MCDT cuja necessidade resultem dessas consultas, possam ser encaminhados para a Rede Convencionada, nos mesmos termos em que o são as requisições dos médicos de família da rede pública de cuidados de saúde primários.
- Garantir que as Convenções atuais, celebradas entre as ARS e as unidades de saúde convencionadas, se mantêm em vigor por um período mínimo de 5 anos, e no caso das ARS virem a ser extintas, as entidades que lhes venham a suceder assumam a responsabilidade pelo cumprimento total e efetivo desses contratos e do seu pagamento.
- Proceder à correção monetária das tabelas convencionadas do SNS, repondo, no mínimo, o valor da inflação acumulada dos últimos 5 anos, garantindo assim a viabilidade e permanência desta Rede Convencionada de Saúde.
Acreditamos que a implementação urgente destas simples medidas, que já provaram a sua eficácia nos MCDT em ambulatório, muito beneficiariam as unidades do SNS que, atualmente, apresentam grandes dificuldades de resposta e, principalmente, os utentes do SNS que hoje em dia não conseguem ter acesso, em tempo útil, às suas necessidades de consultas e MCDT em ambulatório.
Todas as experiências conhecidas cujos modelos de serviços nacionais de saúde que, por opções ideológicas ou experimentalismos, procuraram responder através de recursos e serviços exclusivamente públicos a todas as necessidades de saúde e bem-estar das populações, falharam redondamente. Tememos que em Portugal se esteja a querer ir por esse caminho.
Publicado no Jornal Público a 26 de outubro de 2023
https://www.publico.pt/2023/10/26/opiniao/opiniao/corre-mal-sns-2068053